Brasil estreia no mercado internacional do turismo LGBT

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Para o turismo brasileiro, esta foi uma semana histórica: o país lançou-se para o mundo como destino “LGBT friendly“. O ponto de inflexão aconteceu em Buenos Aires, durante o GNETWORK, o maior evento de marketing e turismo LGBT da América Latina que, ao longo desta semana, reuniu 1.400 participante de 18 países.
A divulgação de um país que se prepara para receber o segmento que mais viaja, que mais consome e que mais cresce foi o ponta pé internacional de uma parceria celebrada, em maio, entre o Ministério do Turismo, a Embratur e a Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil. O acordo prevê a união de esforços para promover destinos nacionais enquanto se sensibiliza operadores de serviços turísticos. O desafio passa por uma mudança cultural.
“Nosso principal desafio neste projeto é chegar a todas as instâncias e confins de um país de dimensões continentais, levando informação e conhecimento, além da importância que o turismo LGBT pode trazer economicamente para uma região”, indicou à RFI o presidente da Câmara LGBT do Brasil, Ricardo Gomes.
O potencial desse segmento é grande, mas ainda falta tato e conhecimento para o setor turístico lidar com esse público. “Nós precisamos levar capacitações e precisamos, para sensibilizar as pessoas, tirar delas aquilo que elas já tiveram em casa na infância com a sua família: o respeito pelo outro acima de tudo”, explica.

A partir de agora, a promoção internacional do turismo LGBT no Brasil passa a ser uma política de Estado que atravessará o próximo governo seja quem for eleito. O acordo tem cinco anos de duração até 2023. É como um seguro contra uma eventual ameaça de um presidente eleito que proclame o preconceito.
“Se tivermos no Brasil alguém que vença as eleições, seja alguém da extrema-direita ou do extremismo evangélico, que queira, por exemplo, romper com esse acordo, estaremos atentos para dar publicidade a esse engavetamento ou a esse cancelamento. Esse presidente e a sua equipe terão de responder publicamente por que não seguem o que diz a Constituição: que todos são iguais perante a lei”, avisa Ricardo Gomes.
Segundo a Organização Mundial do Turismo, entre 8,5% e 10% de todos os turistas no mundo são do segmento LGBT, um mercado que cresce duas vezes mais rápido do que o convencional. Esse público gasta até 50% a mais do que o turista tradicional. Também viaja entre três e cinco vezes a mais. Assim, o bolso pode ser um eficaz acelerador para uma visão mais ampla.
“Se tiver que começar pelo bolso, pela economia ou pelo incremento do seu faturamento, que comece. Pelos efeitos práticos da experiência que temos com associados e parceiros, sabemos que as empresas começam a olhar para a população LGBT pelo dinheiro, mas depois seguem com o seus compromissos sociais”, aposta o presidente da Câmara LGBT. “Que a mudança cultural comece pelo bolso, mas que termine por ser de verdade”, defende.

Destinos LGBT brasileiros 

A Câmara LGBT brasileira apresentou alguns destinos brasileiros que já têm relevância mundial: Fernando de Noronha, o Parque Estadual do Jalapão (TO), Trancoso (BA) e Bonito (MS). Destaque para o “Gay Surf” em Praia do Rosa (SC), experiência única de surfe LGBT na América do Sul, e para a Parada Gay de São Paulo que, com três milhões de pessoas na recente edição 2018, é considerada a maior do mundo.
No que resta do ano, será realizada uma pesquisa no Brasil para traçar um diagnóstico do segmento LGBT. O perfil desse turista e os seus hábitos serão fundamentais para preparar o país para o turismo receptivo.
“O mercado brasileiro tem tanto potencial que vamos divulgar uma newsletter específica sobre o Brasil para mais de 80 países”, antecipa à RFI Clovis Casemiro coordenador da poderosa IGLTA (International Gay & Lesbian Travel Association), uma organização internacional dedicada ao turismo LGBT. “Temos parada gay em Parintins, em plena Floresta Amazônica, e até na Rocinha, a maior favela do país”, destaca Casemiro.

Brasil e Argentina, destinos “casados”

Na região, a Argentina é o país mais avançado na captação do turista LGBT. Esse processo argentino começou em 2002 e foi reforçado por políticas públicas que, ao longo dos anos, incluíram a aprovação do casamento igualitário e da lei de identidade de gênero.
Longe da concorrência, Brasil e Argentina planejam fazer ações conjuntas em feiras internacionais como destinos vinculados. “Poderemos fazer ações integradas. Os ministros do Turismo de ambos os países têm esse desejo de trabalharmos conjuntamente, promovendo o Mercosul”, prevê Ricardo Gomes.
Segundo a Câmara de Comércio Gay Lésbica Argentina, 470 mil turistas estrangeiros desse segmento visitaram o país no ano passado. O número 4,5% maior do que o ano anterior representa 7,6% do total de turistas estrangeiros no país em 2017.
“Os nossos cálculos indicam que esse segmento reserva 10% do que ganha só para gastar em viagens. De cada dez turistas estrangeiros na Argentina, quatro são brasileiros. O turista brasileiro é muito importante para nós”, destaca à RFI o presidente da Câmara argentina, Pablo De Luca.

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